Por a 9 Dezembro 2020

Um apartamento com uma linguagem arquitetónica tão forte que deixa brilhar as outras formas de Arte. O projeto do atelier 7M Arquitectos é uma lufada de criatividade no coração da cidade.

Fotografia: Gui Morelli / Produção: Amparo Santa-Clara

Texto: Mafalda Galamas

Aquele que fora já o último piso deste prédio secular, ‘’nascido’’ em 1910, de traça ornamentada e cheia de cachet é, hoje, habitação de uma família numerosa que faz questão de sentir de perto o pulsar da cidade viva e, a todos, acessível. Durante a década de 70, do século XX, o edifício sofreu obras de reabilitação e ganhou em verticalidade ao serem acrescentados novos patamares. As características estruturais dos andares cimeiros são, no entanto, algo distintas das dos pisos iniciais.

O projeto do apartamento que selecionámos para lhe mostrar nesta edição, tem assinatura do atelier 7M Arquitectos, que segue aos comandos de Mafalda Soares de Oliveira e Matilde da Silva Passos. Deste T3 com 160 m2, as arquitetas não têm dúvidas em afirmar que foi a linguagem arquitetónica da casa o que mais cativou os proprietários. O pavimento e as portas em casquinha, os tetos com estuque trabalhado, o pé direito com mais de três metros, e as imensas janelas de sacada que potenciam a entrada de luz do apartamento, são alguns desses exemplos.

Embora algo degradado no momento da aquisição, a proprietária percebeu de imediato a potencialidade da habitação e, juntamente com a dupla de arquitetas, começaram por redefinir um novo layout, isto é, distribuição das divisões. Privilegiando a zona social da casa à medida que se vai caminhando, deixando a área mais privada ao fundo.

Percebemos desde o hall de entrada, a importância da pintura no seio desta família. Apesar de sermos recebidos pela arca do século XIX, os quadros de Diogo Munhoz e de Cruzeiro Seixas são o statement que fará a ponte para o resto da decoração. Sobretudo, na sala, conjunta com a casa de jantar. Ambas usufruem da amplitude e luminosidade proporcionadas pelas diversas janelas com vistas para uma das artérias mais movimentadas da capital.

A decoração do apartamento foi ganhando maturidade com o correr dos tempos. Tudo foi surgindo e acontecendo ao ritmo de vida do casal. No entanto, assumidamente atentos ao design, nada foi aqui mantido ao acaso. Todos os têxteis foram feitos por medida, dos sofás às almofadas. A ausência de cortinados é intencional de forma a não ofuscar as características tão particulares das paredes e tetos do apartamento. O cadeirão azul com braços originais foi recuperado e, os pretos, adquiridos na loja Mobler, em São Bento. Ao lado, o candeeiro com design e cor de laranja, icónicos, é o Nesso da Artemide.

Porém, o papel principal é desempenhado pelas obras espalhadas aqui e acolá. Destaque para os quadros de Hector Ramsay (o grande de tons preto e branco à esquerda do sofá), e o de João Cristóvão com um azul vibrante e impactante. A escultura de madeira é do artista João Castro Silva e a metálica é de David Oliveira.

A papeleira D.Maria, em vinhático, é uma peça de família, e não é meramente decorativa… Cumpre as suas funções quando o trabalho exige continuidade a partir de casa, sempre sob o olhar atento do Santo António barroco. Ambos encostam ao pilar que é, agora, um nicho e que marca a separação com a sala de jantar. É nele que repousa, de forma discreta, a escultura de João Cutileiro.

Já na sala de jantar rendemo-nos às cadeiras de Marcel Breuer, ao candeeiro da Ligne Roset e carrinho de chá arte nova, dos anos 50. Nas paredes, continuam a brilhar obras de artistas renomados como João Cristóvão, Diogo Munhoz, Gil Maia, Raúl Perez, Cruzeiro Seixas, Malangatana ou Paula Rego. Algumas peças do apartamento foram adquiridas em leilão e galerias, outras herdadas ou trazidas de viagens do casal.

Atravessando o corredor, e uma vez na área mais privada da casa, conseguimos captar a serenidade do espaço. O quarto de casal faz honras à cómoda D.Maria encostada ao espelho que aproveita as tabelas originais da parede para fazerem de moldura.

Uma forma de refletir a luz e de dar amplitude ao quarto. Por cima da cama os quadros têm autoria de Sofia Simões e os candeeiros de parede são os Tolomeo, da Artemide.

Com quatro filhos – duas raparigas pré adolescentes e dois rapazes já adolescentes -, os quartos não poderiam deixar de ser, sobretudo, práticos e funcionais, onde parte do mobiliário foi desenhado pela 7M-Arquitectos.

Todas as zonas húmidas da casa foram, igualmente, repensadas, acrescentando-se, assim, outra casa de banho e ampliando-se cozinha àquilo que, em tempos, fora um… Quarto interior. Agora, reside aqui uma acolhedora copa com bancos rotativos, de estilo industrial que pertenciam ao mobiliário de uma orquestra. E, de um dos bancos fez-se a mesa com o tampo lacado a preto. O candeeiro de teto é o Ktribe, da Flos. Na cozinha os acabamentos do pavimento e bancada são pedra mármore lioz, numa valorização plena do produto nacional, enquanto que na copa preservou-se o soalho existente em madeira.

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