Com projeto de arquitetura do arquiteto César Machado Moreira e interiores do Anantique Studio, esta casa em Lordelo do Ouro, na zona de Serralves, evidencia um estilo eclético, reflexo da essência e histórias dos seus habitantes.
Fotografia: Cláudia Rocha; Texto: Isabel Figueiredo
“A nossa casa deve ser o reflexo de quem somos, expressar a nossa essência, a nossa história. Sou uma apaixonada por viagens; adoro vasculhar feiras de velharias, em busca de peças com história e da possibilidade de as restaurar, recriar ou simplesmente deixá-las mostrar que o tempo passou por lá; gosto de peças artesanais, que preservam conhecimentos antigos, sujeitos a desaparecer, se não forem recuperados e valorizados”, assim inicia a conversa Ana Bessa, que assina o projeto de interiores da casa.
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Por tudo isto, prossegue, o estilo que melhor define o que aqui encontramos, é eclético. Palavra que aqui cabe como uma luva. Que aqui tem tanto sentido. Uma mistura de industrial – observado no programa de plano aberto, nas grandes portas de vidro, e em matérias-primas como ferro e microcimento –, de ‘vintage’, “com várias peças recuperadas por mim”, mas também de escandinavo e de étnico, “essencialmente de Marrocos, do Mali e da Turquia”, entre outros.
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E neste ambiente heterogéneo, continua, “ressaltam também valores de sustentabilidade, em que acredito, sem perder de vista um ambiente intemporal, harmonioso e acolhedor”.
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Por ter vivido uns anos em Lisboa, frequentou, entusiasticamente – “e porque sempre gostei muito de móveis antigos” –, a oficina de restauro e reciclagem do Artlier, uma escola de artes e ofícios. “Queria partilhar com o mundo esses meus trabalhos e por isso criei, em 2014, um blogue, o Anantique – Coisas com Alma”, conta-nos. “Curiosamente, ou talvez não, o nome Anantique (Ana + Antique) surgiu de um passeio pela Feira da Ladra”, em que se apaixonou por um original e antigo “A” vermelho, em chapa, que se exibe hoje no hall de entrada desta casa.
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Desde sempre uma apaixonada por decoração, Ana estudou design de interiores, na Lisbon School of Design, já a residir no Porto, aproveitando uma janela de oportunidade que se iniciou com a licença de maternidade.
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Assim, paralelamente à sua atividade como farmacêutica, no mundo corporativo, desenvolve projetos de design de interiores, em ‘part-time’ e essencialmente online, com o Anantique Studio.
“Uma das coisas que mais me encanta é o efeito surpresa suscitado, para quem aqui entra pela primeira vez. Ao passar nesta rua estreita não se imagina todo o espaço que se desenrola para lá da fachada e que termina com o jardim”.
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É uma casa estreita e comprida, mas muito luminosa, graças à forma como foram criadas as entradas de luz, oferecendo três espaços exteriores: o terraço, no último piso, a que se tem acesso pelo escritório; o jardim, alcançado pela sala de estar; o pátio interior, entre a cozinha/sala de jantar e a sala de estar, inteiramente revestido a madeira e com grandes portas de vidro.
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“Este último espaço, para além da função prática, porque é muito usado para refeições, permite a continuidade entre todas estas divisões e o jardim, porque quem está na sala de jantar consegue avistar a sala de estar e o jardim através dos planos de vidro e tem a perceção de uma área muito ampla”.
Aqui dentro, todas as peças, seja qual for a sua proveniência, falam entre si. “O que mais me agrada, é esta mistura improvável, mas harmoniosa, de peças, que encerram em si próprias uma história, ou que contam a nossa, conjugadas com outras, contemporâneas – uma simbiose acolhedora entre o novo e o velho”. São várias as peças ‘vintage’, algumas delas em que tropecei acidentalmente, na rua ou em feiras de velharias”, e por si recuperadas. É o caso de uma das mesinhas de cabeceira ‘art déco’ e da cómoda da suíte principal ou da cadeira do hall de entrada.
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“A mesa de apoio ao sofá foi feita por mim, a partir de uma rodela de um tronco de castanheiro, árvore que encerrava uma história bonita na família. O holofote de teatro da sala de estar, Bardwell & McAlister, iluminou palcos em Hollywood, nos anos 60 e foi comprado num leilão. O banco de carpinteiro provém de uma antiga carpintaria”, aponta.
A estas, juntam-se peças de design, como o aparador da Olaio, o antigo modelo Caravela, mas de produção recente, as cadeiras da mesa de jantar nórdicas ‘midcentury’, de Th. Harlev, o cadeirão de madeira e corda preta, na sala de estar, peça contemporânea da dinamarquesa Godsk Snedkeri, os candeeiros de mesa do hall de entrada e de pé, de apoio ao sofá, do designer espanhol Miguel Milà ou a mesa da sala de jantar do designer Christian Haas, da Wewood.
São, também, muitas as peças de família – jarras, louças e pequenos objetos e refere, como bom exemplo, o gato de porcelana, na entrada de casa, peça que está na família há mais de 100 anos. Conta-nos que foi por ele que a primeira palavra que o pai disse foi “gato”.
Os pais sempre foram grandes apreciadores de pintura, “por isso ofereceram-nos quase todas as obras que temos. Algumas, como as do hall de entrada, vieram de sua casa.
O pescador, de Hipólito Andrade, tal como acontece aqui, era o primeiro quadro que eu via ao entrar na casa onde sempre vivi com eles”. Os tapetes da entrada, trazidos de Marrocos e da Turquia, a escultura em madeira no mesmo espaço, que é, na verdade, uma escada da tribo Dogon, do Mali, os potes de terracota com plantas, todos de Marrocos, bem como o tampo de ladrilho, também em terracota, da mesa do pátio interior, e, no móvel da sala de estar, a peça arredondada – um batedor usado pelas tribos berberes do norte de África para transformar o leite em manteiga –, atestam a preferência pela combinação inteligente que apenas uma mente curiosa consegue compor.
No que toca aos materiais, convivem o pavimento em microcimento, o vidro e o ferro. As paredes, com reboco pintado de branco, estabelecem um diálogo muito interessante com as carpintarias lacadas de cinza e com detalhes em pinho.
“No fundo, os materiais simples, depurados, fazem sobressair a natureza dos espaços exteriores e favorecem a boa iluminação natural”, comenta. “Nas áreas privadas dos pisos superiores optámos por pavimento em madeira de riga”.
Estes materiais articulam-se com as texturas naturais e orgânicas das peças e têxteis escolhidos para a decoração, como as madeiras cruas, o bambu, o sisal, o linho ou a lã. “Gosto de texturas simples, de materiais que envelheçam bem e em que a imperfeição é bem-vinda. Tento, o mais possível, seguir uma ótica ‘SLOW’: Sustainable – Local – Organic – Whole, porque acredito em design de interiores mais assente em valores de sustentabilidade.”
O programa em ‘open-space’, com exceção das três suítes e da casa-de-banho social, desenvolve-se em meios pisos. O hall de entrada e garagem alojam-se no piso térreo. Subindo o primeiro lanço de escadas, fica a área social, sala de jantar/cozinha, lavandaria, pátio interior, sala de estar e jardim com piscina. No meio piso seguinte fica a zona das crianças, com duas suítes e uma área de biblioteca e cantinho de brinquedos. Para o outro meio piso foi destinada a suíte principal, com closet e, por fim, no último meio nível, fica o escritório e um terraço.
No total, somam-se aqui 283m2 de área interior, a que se juntam os 145m2 de jardim. Tudo bem estudado, organizado e ponderado, mas sempre com fator ‘wow’ à espreita a cada esquina.