Por a 18 Outubro 2025

Escondida entre as curvas dos Alpes, na serenidade da aldeia histórica de Cisore, esta intervenção de restauro devolveu vida e memória a uma casa que carrega séculos de história.

Projeto: Atomaa

Situada no norte do Piemonte, a poucos passos de Domodossola, a paisagem que a envolve parece saída de uma tela: montanhas que sussurram histórias antigas, sobre a fronteira entre Itália e Suíça, onde se cruzam a essência austera dos Walser do Vale Formazza e as pinceladas vibrantes dos pintores do Vale Vigezzo.

É um lugar que se pode alcançar também a pé: uma viagem que começa em Milão, onde reside o cliente, segue de comboio até Domodossola e termina com uma caminhada por uma antiga vereda de mulas até Cisore. Um paraíso tão remoto quanto acessível.

A casa que esteve no centro deste projeto guarda memórias familiares profundas. Outrora pertencente aos avós do cliente, encontrava-se abandonada há mais de vinte anos. Mesmo assim, as suas características originais resistiam ao tempo, e o objetivo foi respeitá-las, preservá-las e realçá-las, como se fossem relíquias de outro tempo.

O maior desafio foi o espaço. A casa original era escura, fria e compartimentada, como tantas antigas habitações de montanha. A nova visão, porém, trouxe luz, fluidez e ligação entre os ambientes. Através de aberturas estratégicas e soluções arquitetónicas precisas, a luz passou a invadir cada canto.

escada, íngreme e imponente, ganhou destaque: tornou-se o elemento central da narrativa arquitetónica, ligando os pisos e preservando o seu caráter original. As novas aberturas, criadas para permitir a passagem da luz entre a sala e a cozinha, deram-lhe protagonismo e profundidade.

cozinha, com a sua lareira monumental — o coração da casa —, foi transformada num acolhedor espaço de convívio, ideal para conversas e jantares entre amigos. Cada detalhe, dos pavimentos e tetos em larício, nogueira e castanheiro à pátina do tempo que cobre cada superfície, foi tratado com cuidado artesanal. As vigas, outrora enegrecidas pelo fumo ou branqueadas pela cal, foram recuperadas por mãos experientes.

vermelho da resina pompeiana, em contraste com o ferro escuro dos corrimões e das estruturas metálicas, atua como fio condutor, sublinhando as intervenções contemporâneas e revelando a passagem do tempo com elegância.

No piso superior, o equilíbrio entre tradição e conforto moderno ditou a inclusão de uma nova casa de banho, pequena mas funcional, revestida nos mesmos tons vermelho e bordeaux que percorrem todo o piso térreo.

Uma claraboia de vidro revela a essência do telhado e transforma o sótão num lanternim luminoso, ampliando o espaço e iluminando o quarto mais pequeno. A cobertura em pedra composta pelas tradicionais piode di beola foi cuidadosamente restaurada, mantendo a sua imponência.

Apesar da robustez exterior, feita de pedra local, o interior esconde um coração de madeira acolhedor, que pode servir de quarto extra no verão ou de espaço lúdico.

No exterior, a intervenção foi mínima e respeitosa com o contexto histórico. Pedra, reboco de cal natural e uma videira americana, que sobreviveu milagrosamente ao abandono, enquadram o espaço. Um olival, jasmim e ervas aromáticas envolvem a mesa de pedra, que volta a acolher pequenos-almoços e jantares de verão à sombra da vinha.

Hoje, Cisore é mais do que uma casa restaurada: é um refúgio que respira memória e olha para o presente com esperança, provando que a arquitetura pode preservar a alma de um lugar e das pessoas que o habitaram.
Um abrigo luminoso e acolhedor, onde tradição e inovação se encontram para contar uma nova história.