Um diálogo entre abstração e decoração, num apartamento com vista para os telhados de Milão.
Projeto: PLUS ULTRA / Fotografia: Federico Villa / segundo a memória descritiva
Localizado em Milão, no bairro Sant’Ambrogio, e recentemente concluído, este apartamento foi desenhado pelo escritório de arquitetura PLUS ULTRA (Alessandra Castelbarco, Marco Di Nallo e Chiara Girolami) para um casal apaixonado pelo design clássico. ”Arcos e padrões”, grosso modo, podem ser as suas principais características, mas há mais neste projeto particular.
O acesso ao apartamento, situado último andar de um edifício da década de 1950, faz-se através do átrio e pátio da Casa Volonteri – um palácio histórico do século XVII conhecido pela sua fachada com intervenções arquitetónicas de Giuseppe Sommaruga, misturando elementos do estilo Liberty com uma Influência barroca.
No seu interior, existe uma espécie de celebração e diálogo entre abstração e decoração, num layout de onde sobressaem detalhes gráficos e texturas contemporâneas. ‘’O trabalho de distribuição, geometrias, cores e texturas define inicialmente uma espécie de tecido conjuntivo que surge como a verdadeira intervenção arquitetónica: discreta, sofisticada e determinada’’, pode ler-se na descrição a que a Urbana teve acesso.
O projeto surgiu da necessidade de reorganizar os espaços do apartamento, que careciam de uma hierarquia clara na sua sequência. O objetivo principal era o de restaurar a sua ordem funcional e espacial, criando um layout mais limpo e definindo uma nova atmosfera através de uma seleção específica de materiais e cores. Além da coleção existente dos clientes, de clássicos do design, os arquitetos selecionaram e integraram cuidadosamente algumas peças contemporâneas.
No apartamento original, a presença de duas entradas opostas transformava a sala numa espécie de ‘’via pública’’. No novo layout, os arquitetos optaram por manter uma entrada única, criando um espaço que serve de corredor e que conduz à sala de estar através de duas aberturas em arco. Esta escolha, representa para os arquitetos — que possuem um profundo conhecimento dos edifícios históricos e das obras dos grandes arquitetos milaneses —, uma interpretação da filosofia de Luigi Caccia Dominioni, que expressou o seu desagrado pelas entradas diretas nas salas, afirmando que “não deixam espaço para surpresas”.
A área de estar, voltada a leste, foi projetada para ser espaçosa e fluida, com cantos dedicados a diversas atividades como jantar, conversar, ler e ouvir música (o cliente dispõe de um pequeno acervo de discos e livros de ópera). Parte integrante deste convívio é também a cozinha, que dá para a sala através de uma grande janela de aço. A cozinha, foi desenhada como uma extensão perfeita do espaço de convivência, onde ações cotidianas como a preparação de refeições, usufruem de uma continuidade visual ininterrupta. Esta fluidez é conseguida através de um vidro transparente.
O projeto foi concebido com o objetivo de encontrar um equilíbrio entre duas tensões contrastantes: por um lado, o desejo de evocar a história e a essência dos objetos e da casa; por outro lado, a vontade de criar novas geometrias utilizando elementos gráficos e materiais contemporâneos.
A seleção de elementos e cores foi meticulosa. Exemplo disso é o papel de parede escolhido para a entrada, com linhas verticais sombreadas que lembram a boiserie das áreas comuns, conferindo a este espaço um papel mediador entre as esferas pública e privada. Detalhes em latão, como o puxador Cono desenhado por Gio Ponti, evocam o estilo da arquitetura milanesa do pós-guerra. A escolha do candeeiro, a arandela Flos IC de Michael Anastassiades, lembra as luminárias encontradas nas entradas milanesas, mas com linhas mais essenciais e um toque de familiaridade.
Na cozinha, cada componente é caracterizado por uma cor ou padrão que realça a sua identidade volumétrica: as colunas são em carvalho tingido, as bases são brancas e os móveis de parede são num delicado amarelo pálido. A ilha central, concebida como uma estrutura monolítica de terrazzo, representa a síntese desta paleta. As sombras de verde presente nos agregados lembram os tons do volume da janela e da entrada, criando relações sutis entre os espaços.
Na sala, que dá para um longo e estreito terraço escavado na inclinação do telhado, a iluminação artificial foi cuidadosamente projetada. As cornijas entre as paredes e o teto, parcialmente existentes, foram utilizadas como elementos reflexivos para acomodar a iluminação indireta através de faixas de LED colocadas na moldura de gesso que percorre todo o perímetro. O icónico candeeiro Arco, utilizado na sua conceção original, ilumina e decora a área de jantar. Também na cozinha, a iluminação indirecta colocada por cima do mobiliário é complementada por dois candeeiros suspensos que ecoam as geometrias da ilha e da mesa.
Uma porta escondida separa a sala da zona privada do apartamento, que é composta por dois quartos, um escritório, duas casas de banho e uma área de serviço. Estes espaços distribuem-se ao longo de um corredor central, pontuado por uma abertura em arco.
Os tons quentes dos telhados de Milão e os rebocos coloridos das janelas da sala de estar são introduzidos e levados para dentro do quarto para criar um ambiente aconchegante e familiar. O quarto principal foi concebido como um volume puro, caracterizado apenas pela cor, acolhendo uma cama de dossel com linhas minimalistas, que quase cria um “espaço dentro do espaço”. O lavabo principal segue a mesma paleta de cores, mas com a adição de uma parede cerâmica em azulejos verticais em tons pastéis de verde acinzentado. O piso é em terrazzo vermelho-terracota e mais uma vez, os detalhes gráficos em preto criam um contraste com a paleta de cores suaves. O grande espelho feito sob medida, integrado à iluminação, amplifica o efeito da luz natural e amplia visualmente o espaço.
Apesar do seu pequeno tamanho, a outra casa de banho foi concebida como um quarto dentro de um quarto. A zona da banheira caracteriza-se por um esquema de cores em amarelo, o teto é azul e o pavimento em azulejos azul-acinzentados. As paredes são revestidas em tijoleira amarela, com elementos pretos contrastantes que enfatizam graficamente as geometrias. O escritório e o quarto mais pequeno, foram projetados para complementar a estética geral da casa, permitindo flexibilidade na sua utilização ao longo do tempo. Estes espaços foram concebidos para acomodar as necessidades da família em crescimento, incluindo a chegada de um recém-nascido. Eles foram projetados para acolher facilmente mudanças na disposição dos móveis e adaptar-se às crescentes exigências da família.
A narrativa de ‘’Arcos e Padrões’’ – nome dado à casa -, desdobra-se perfeitamente à medida que nos movemos de um espaço para outro, guiados por elementos de design interligados. Por um lado, encontramos geometrias suaves e curvas, desenvolvidas volumetricamente nas aberturas e graficamente nos móveis. Por outro lado, a interação harmoniosa de cores e padrões define funções distintas, mantendo um fio condutor que acompanha a exploração de cada área única.