Em Lisboa, o apartamento de 1930 inteiramente renovado do bretão Alan Louis, desenhador, designer e ceramista autodidata, é hoje a sua habitação e estúdio. Uma ‘ilha’ na cidade a ver o Tejo.
Fotografia: Alan Louis Studio / Texto: Isabel Figueiredo
Localizado no bairro histórico da Lapa, em Lisboa, numa rua virada para o rio Tejo, conta uma área total de 120 m². Datado de 1930, o apartamento pedia uma remodelação, exibindo vários compartimentos, todos de pequenas dimensões, com a casa-de-banho junto à cozinha, algo usual naquela época mas pouco práticos nos dias de hoje.
“Resolvi partir paredes para abrir o espaço e trazer a luz para dentro, abrir janelas e retirar as portas para colocar cortinas ou portas de vidro”, conta-nos Alan Louis.
“A primeira coisa em que reparei foi nos sinais de antiguidade da casa, que parecia tão velha e escura, tão afastada da luz, com todos aqueles pequenos espaços, mas estava lá o potencial, como a marquise, tão bem iluminada, permitindo uma visão geral dos jardins internos do bairro e alguns pormenores vintage que decidi manter porque me fazem viajar pela alma do espaço”.
“Assim que consegui ter um espaço amplo e aberto, senti-me muito mais sereno e apto a residir entre aquelas paredes. Senti que queria viajar e percorrer vários destinos ao mesmo tempo. Lugares que me lembram serenidade”. E Alain resolveu, assim, deixar-se guiar por essas vibrações. “Queria algo suave e claro, que permitisse a luz circular de um espaço para o outro, que os raios de sol pudessem deslizar sobre cada parede, e como tal pintei tudo de branco, fiz alguns arcos para substituir as portas, importando um toque mediterrâneo somado a uma coleção de cactos – porque eu os adoro e porque os cactos sobrevivem em lugares difíceis”.
Outro aspeto que Alain destaca de entre as suas preferências, nos edifícios, prende-se com a idade. “Gosto de ver as cicatrizes dos espaços e por isso decidi manter o aspeto brutalista nalgumas das paredes, porque paredes destruídas são testemunho de uma época, mas também são, ao mesmo tempo, modernas. Um jogo de oposto controlado de que gosto”.
Todos os móveis escandinavos dos anos 50 que Alain tinha em Paris habitam hoje na sua casa de Lisboa, “porque são peças que se diluem e combinam perfeitamente no local e também são testemunho do tempo, uma herança do passado. Mantive o soalho original, que afaguei e envernizei para obter um aspeto refrescado, sem apagar a marca do tempo. Ainda podemos observar que é um soalho antigo”.
Alain começou a criar peças de cerâmica especificamente para o apartamento, porque queria algo “realmente sob medida”. E foi assim que “decidi criar a minha própria marca de decoração. Este apartamento é a minha principal fonte de inspiração, imagino cada objeto que crio para caber nesta casa”.
O banco Júpiter, a mesa Joia e o Titã foram feitos para esta casa. “Quis que a decoração celebrasse o artesanal e o natural, que exibisse peças feitas a partir de materiais naturais, e nesse aspeto a cerâmica é perfeita e faz parte da identidade de Portugal”. Alain também usou a pedra mármore, que encontrou em Sintra, para fazer a mesa de jantar, a mesa de centro da sala e a bancada da cozinha. Todas feitas sob medida para o apartamento. O lavatório é esculpido no mármore e cada laje de pedra resultou num quebra-cabeças “para fazer os vãos do mármore combinarem entre si”.
Mas o objetivo principal nunca foi ter algo perfeito. Alain queria um projeto que fosse o espelho da sua mente, um espaço que a reproduzisse. “Um lugar onde pudesse inspirar-me quando estou deitado no sofá, e para isso precisava de uma casa com objetos pessoais, que recrutei, aqui e ali, ao meu passado, objetos que contam uma história. E precisava de me fazer rodear de tons naturais para que o meu cérebro pudesse estar realmente focado quando trabalho em casa. Além disso, também queria abraçar um projeto onde a marca do tempo estivesse presente, uma casa que mostrasse as suas cicatrizes, as histórias das pessoas que aqui viveram antes, porque para mim é importante respeitar isso”.