Por a 3 Dezembro 2024

Maria e João compraram o apartamento em 2021 e, apaixonados pelo seu potencial, decidiram meter mãos à obra, com muitas pinturas pelo meio, aventuras e desventuras, mas acima de tudo com a vontade de inspirar os outros!  As fotografias são de Gui Morelli.

Texto: Isabel Figueiredo / Produção: Amparo Santa-Clara / Fotografias: Gui Morelli

Na altura da aquisição deste apartamento, em dezembro de 2021 — originalmente um T7, convertido num T4 — o branco dominava! Sem sancas, nalgumas das suas divisões, e maioritariamente apoiado por iluminação de focos, com luz branca nos tetos, além de portas e portadas na cor casca-de-ovo e um extenso corredor, o layout e cores da casa aproximava-se mais de um ambiente tipicamente de escritório — “na brincadeira, até dizíamos que parecia uma repartição de finanças —, do que o de um espaço habitacional. “Visualmente”, diz-nos Maria, “o espaço parecia-nos frio, moderno e pouco acolhedor. Mas tinha uma boa base! Além disso, gostámos da reabilitação anteriormente levada a cabo nas casas de banho e na cozinha, cujos azulejos de chão e parede tinham qualidade e bom gosto, bem como do pé direito generoso e do chão magnífico, de tábua corrida, com uma cor muito bonita”, fatores decisivos para avançarem para a compra. “Tudo somado, identificámos que a casa tinha uma boa ‘vibe’ e todo o potencial para ser o nosso próximo projeto”.  

Aquando da compra do apartamento, Maria e João decidiram documentar o ‘antes e depois’ de todo o projeto, “com as aventuras e desventuras, alegrias e tristezas ao longo de todo o processo, com o intuito de inspirar e entreter os nossos amigos” e, para esse efeito, “decidimos criar uma página de Instagram e ir documentando e partilhando as peripécias da remodelação, as compras e a decoração” acrescenta João.  “Assim nasceu o @velhinho_em_folha, que conta hoje com mais de 10 mil ‘velhinhos’, que ao nosso lado criaram uma comunidade que nos acompanhou em todo o projeto, no decorrer dos últimos dois anos — têm sido uma companhia incrível”.  

Pinturas… muitas pinturas! “Reparámos e pintámos toda a casa, tetos e paredes, portas e portadas. Fizemos variadíssimos testes de cor e, por fim, escolhemos um tom que nos pareceu muito elegante e acolhedor”, diz Maria.  Foram aplicadas sancas no corredor e escritório — “a diferença do antes e depois é surreal e é realmente divertido perceber como tal faz toda a diferença em termos visuais”.  Da mesma loja onde adquiriram as sancas, trouxeram as rosetas para aplicar nos tetos das salas já que, para esta dupla, “as zonas de estar são tradicionalmente mais sofisticadas”.  

Como gostam de dar atenção aos detalhes, “resolvemos trocar toda a aparelhagem elétrica e, não satisfeitos, resolvemos trocar também as maçanetas das portas e as ferragens para se adequarem à decoração da época”. Para tal, escolheram a Casa Guedes, uma das lojas de ferragens mais antigas de Lisboa e, entre centenas de opções, acabaram por escolher aquelas “que nos pareceram fazer o ‘match’ ideal com as nossas portas e, claro, gosto pessoal”. Neste processo, até os batentes de portas foram substituídos, “porque o espírito da casa tinha de ser transversal”.  Foram ainda trocados os focos de teto por candeeiros — caso daqueles que estavam no corredor e na cozinha — e o resultado “deixou-nos de queixo caído”. Para a cozinha, Maria e João optaram pela colocação de um exaustor e, para o efeito, montaram uma estrutura com pladur com instalação na chaminé.  

“Para tornar a casa mais elegante e harmoniosa, pareceu-nos que a solução passaria por criar uma ‘boiserie’, pelo que comprámos mais de 200 metros de perfis de madeira, e fizemos setenta e sete molduras para o corredor, sala de jantar e sala de estar, em tudo parecidas às originais, que ali sempre tinham estado”. E que, como nos referem, “fizeram toda a diferença”. Para além disso, “pintámos a varanda a tardoz e lixámos e pintámos o gradeamento das duas varandas (frente e tardoz)” e repararam o chão de toda a casa, especificamente por via da aplicação de massa nas juntas do pavimento de madeira, “que por ser original e bastante antigo, já tinha muitas falhas”, explicam. Por fim, e porque as pedras das janelas são antigas, foi feita uma impermeabilização das pedras exteriores e recuperadas as madeiras dos parapeitos das janelas, tudo intervenções de manutenção, mas, sobretudo intervenções que visaram ressuscitar o carisma e o design clássico dos anos 30/40.  

Originalmente um T7, este apartamento, entretanto convertido num T4, é composto por duas salas — de jantar e de estar —, cozinha, dois quartos, um deles suíte com ‘walking closet’, um WC social, escritório e uma varanda. “Não fizemos qualquer alteração ao layout da casa”, salienta Maria. “Não era necessário, porque somos apenas dois e achámos que a disposição da casa era suficiente e funcional”. Com áreas muito generosas, o apartamento é “perfeito para uma família urbana, com gosto requintado, para aquelas famílias que gostam de casas charmosas e que honram a sua história, mas também para um casal mais velho, que goste de receber os netos em casa e valorize este tipo de detalhes e traça antiga”.  

Confortável, luminoso e espaçoso, ideal para receber a família e os amigos, com uma varanda que, nos dias quentes, convida a refeições ao ar livre, o apartamento assenta a sua beleza na sua antiguidade e história. Alojado num prédio de charme de 1920, que tem vindo a ser reabilitado “com bom senso e muito bom gosto”, este apartamento é um convite expresso à qualidade de vida na cidade. A luz natural, da manhã e do final do dia, invade os interiores com generosidade; o chilrear dos pássaros que se empoleiram nos ramos das árvores vizinhas e a sensação de estar distante do bulício da cidade, são tudo predicados que o casal enuncia, com agrado. “A sua localização é incrível”, lança João. “Estamos no centro de Lisboa, em Campo de Ourique, num bairro onde podemos fazer tudo a pé e raramente precisamos de andar de carro”.    

A decoração é assumidamente vintage e ‘mid century’, o que está bem patente nos móveis da sala de estar e jantar, mas não só! “Gostamos de misturar um bocadinho de vários estilos. Gostamos do estilo urbano e de ‘street art’, e daí a presença de quadros e outras peças de artistas de ‘street art’, como skates, cacifos e outros artigos mais industriais que marcam uma presença mais irreverente e da qual não prescindimos”. Maria e João também se inspiraram no estilo ‘boho’, porque adoram misturar cores, padrões e texturas. “Prova disso são os nossos tapetes persas, o tapete de vaca e o pufe marroquino que adoramos conjugar com a restante decoração. Dá um ambiente mais descontraído, relaxante e despretensioso”.  Aqui e ali, podem ser vistas as peças Bordallo Pinheiro, caso do bacalhau pendurado na parede da cozinha, bem como outras peças de cerâmica de autores portugueses e ainda outras, adquiridas em feiras, “que remetem mais para casa da avó”.  Aqui, há um pouco de tudo: “Uma miscelânea que procuramos que seja confortável e harmoniosa, que inclua muitas plantas, cores quentes, tapetes e candeeiros”.   

Para os móveis da sala, o estilo escolhido foi o ‘mid century’, pelo que é indispensável a presença de algumas peças da Olaio, particularmente do José Espinho – modelo Caravela; são peças simples, intemporais e com design muito elegante. “Gostamos de encher as paredes, os móveis e as estantes com peças de cerâmica da Bordallo Pinheiro, do Laboratório d’Estórias, do António Vasconcelos Lapa, da Júlia Quota, da Rosa Ramalho e do Carlos Manuel Gonçalves… O que é nacional é tão bom e enche-nos as medidas”.  

E como a decoração trepa pelas paredes, na casa podemos ainda ver peças de Vhils, Shepard Fairey, Wasted Rita, Malibu Ninjas — “que arrancámos da rua” —, Akacorleone (um dos preferidos da Maria), Tamara Alves, Mais ou Menos, Man Kid Man e até da Vida Portuguesa – “que tem uns clássicos muito giros”. Também esta uma lista quase exclusiva de nomes portugueses, “porque adoramos apoiar o que é nosso”.  

Um dos seus desafios mais recentes passa por utilizar a iluminação para criar ambientes intimistas e acolhedores, pelo que tentam, sempre que possível, optar por iluminação de parede e chão, em detrimento de iluminação de teto. “É claro que esta tarefa é mais simples quando adquirimos candeeiros de qualidade, peças de design como o Nesso do Giancarlo Mattiolli ou do Smile do Mr. Maria, que são candeeiros bonitos quando estão apagados, mas que se revestem de todo o seu esplendor quando a noite cai e se acendem as lâmpadas. São peças mais caras, adquiridas aos poucos e poucos, mas que valem todos os cêntimos”. E porque nem tudo podem ser peças novas, algumas delas foram compradas em plataformas como o Olx ou o Wallapop: “Temos mil e um alertas prontos a fazer-nos saltar da cadeira para o carro em missão de resgate para a nossa casa”. No meio desta busca pela diferença e o lado curioso e história das peças, Maria e João tiveram a sorte, como nos confessam, de herdar e recuperar alguns bens da família, caso das poltronas do tio-avô, do tapete de vaca que está na sala de estar — “era do tio do João e dá um ambiente meio ‘boho’ ao espaço —, do busto do avô da Maria, que era advogado e professor universitário, das máquinas de escrever, binóculos ou rádios antigos.  As caixinhas de viagens de madeira, pintadas à mão, com os destinos das viagens que foram fazendo, são ainda apontadas, como algumas das peças do coração.  

“Depois do fim das obras, começámos a partilhar a decoração e surgiam muitas perguntas sobre as caixas e interesse na sua aquisição, por isso, neste momento, estamos a vendê-las na nossa página de Instagram”. Para tal, encontraram uma carpintaria em Braga que fabrica as caixas e as envia para Lisboa. Depois, Maria e João metem mãos à obra, pintam as caixas conforme a cor e o destino e, no seu interior, quem desejar pode guardar “bilhetes de comboio, fotografias, recibos de restaurantes, frasquinhos de areia e um sem-número de lembranças das suas férias”.  Adoram visitar as feiras e “piscar o olho a qualquer coisa que possa fazer sentido ou que seja divertido”. No lote de artigos da feira, Maria e João apontam os quebra-nozes, as réguas, livros, discos de vinil e ou os pesos para segurar as portas, como exemplo.  Mas um passeio na rua também pode estar na origem de uma peça e de uma nova história! “O skate que decora a WC social e a maior moldura que temos, de quase 2 m por 1,5 m, que alegra o quarto das visitas, são exemplos destes achados espontâneos”.  O que mais os diverte é o processo… “Os nossos projetos têm sido longos e temos trabalhado na nossa paciência, mas a busca por uma nova peça (com sorte, uma pechincha) é uma emoção que nos faz apreciar aos poucos cada projeto”. 

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