Por a 24 Janeiro 2023

Está cientificamente provado que o ambiente ao nosso redor – e as cores que nele existem – influencia diretamente a nossa saúde física e mental. Num país onde ainda existem mitos enraizados sobre o uso da cor, fomos falar com Susan Fischer, arquiteta, consultora internacional de cor e pessoa que desmistifica o uso da mesma em três tempos.

Fotografias: Ed Robinson

No Príncipe Real, Susan Fischer criou a Color Shop, um espaço concebido para que qualquer pessoa possa ter um encontro com a cor. Mas este não é o único serviço que a chilena a viver em Lisboa tem para oferecer. Da consultoria aos workshops, passando por retiros imersivos e criativos, Susan dedica os dias a levar a cor a quem a quiser abraçar.

Susan Fischer, ©Ed Robinson

Susan, é arquiteta, vive em Lisboa e é consultora internacional de cores. O que mais podemos saber sobre si?

Susan Fischer: Nasci no Chile, de pai alemão e mãe chilena. Morei em alguns países como Albania, Alemanha, Inglaterra, Irlanda do Norte e até num navio durante um ano. O meu marido é chileno e temos uma filha chilena, um filho irlandês e uma filha portuguesa.

Sou fundadora da Unbox Color e abri o meu showroom no Principe Real há pouco tempo, onde tenho a representação em Portugal da marca de tintas premium e ecológicas ‘The Little Greene Paint Company’, além de outras marcas como ‘Autentico’, ‘Croma Natural Paints’, e outros revestimentos como ‘New Terracota’, ‘Muratto’, ‘Microcrete’, ‘Finsa’, etc. E sou membro e parte da equipa dos Órgãos Sociais da APCOR (Associação Portuguesa da Cor).

Na prática, o que faz uma consultora internacional de cores?

Como consultora de cor, entendo os efeitos psicológicos e simbólicos da cor e como isso afeta os diferentes espaços. Consigo traduzir em cores as emoções que o cliente quer sentir em cada espaço e trabalho com as cores, mas também com os materiais já existentes e o mobiliário ou tapetes que se querem manter. O contexto também é fundamental na hora de criar paletas de cor para conseguir fluidez entre os espaços. Dentro do possível, crio paletas para a casa como um todo e não só para cada divisão em separado.

Depois de um cliente marcar uma consultoria, envio um questionário para compreender melhor a relação própria de cada pessoa com as diferentes cores e conseguir ir com uma ideia do que o cliente quer para cada espaço. No dia da consultoria, faço questão de falar muito com os clientes para aprofundar a relação deles com a cor, estudo os elementos arquitetónicos de cada espaço, a incidência da luz natural e artificial e os elementos existentes. Procuro inspiração em alguma peça ou obra de arte que o cliente goste muito, e através de amostras de cor, faço  sugestões de combinações até acertar com o cliente quais são as cores mais adequadas. 

Quando o espaço tem determinadas características, encorajo os meus clientes a sair do óbvio e da zona de conforto e a pensar a cor fora da caixa. Dou ideias de color blocking, accent walls, color drenching e também de como pintar os tetos. Sim! A quinta parede não precisa de ser branca.

Depois de alguns dias envio um Color Report ao cliente com um resumo do falado, uma descrição de cada divisão com as cores (referências) e acabamentos escolhidos, e algumas ideias de decoração. Se for preciso, envio também um Color Plan para os pintores.

Muitos dos meus clientes são estrangeiros que compraram casa em Portugal e que querem pintá-la antes de virem morar para cá, pelo que eu vou até à casa e faço a consultoria online com o cliente.

Qual é a importância da cor na nossa vida? De que forma pode alterar estados de espírito e disposições?

Está cientificamente provado que o ambiente ao nosso redor influencia diretamente a nossa saúde física e mental, pelo que, muitos estão a expressar a sua criatividade em casa como forma de aumentar os seus sentimentos de alegria e bem-estar.

O branco puro não existe na natureza, e portanto não consegue conectar-nos profundamente com a nossa essência.

Quando conseguimos identificar cores que estão diretamente ligadas à nossa memória afetiva e as utilizamos nos nossos interiores, isso pode ter um efeito transformador na maneira como habitamos.

O que é que dita uma tendência no que às cores diz respeito?

Os estudos de tendências estão diretamente ligados aos eventos sociais, ecológicos e políticos que ocorrem no mundo. A última foi sem dúvida a década dos cinzas frios, até que chegou a pandemia e precisámos de encontrar conforto, pelo que as cores tendência começaram a aquecer. Os cinzas agora são mais quentes, e um dos novos neutros para o 2023 é o castanho, nas suas diversas tonalidades. Esta cor aconchegante conecta-nos com a terra e com as propriedades restauradoras da natureza.

O importante ao usar cores tendência é combiná-las com outras cores para que não fiquem datadas rapidamente.

Vemos muitos interiores minimalistas, onde predomina o branco pontuado por paletas de cor mais nudes. Como olha para estes ambientes?

Muita gente pensa que por ser consultora de cor, não gosto de ambientes minimalistas e neutros. Nada disso! Cada espaço precisa de se conectar com os seus moradores e se as pessoas que vão morar nesse espaço se conectam com cores neutras é excelente. Outra coisa é quando se usam cores neutras só por moda, ou por medo ou por não se saber usar a cor.

Quando um projeto de interiores se destaca, muitas vezes é pelo bom uso da cor. Passa por entender e aprender a usar a cor com mais confiança, sendo esta parte vital do projeto desde o início.

Mesmo quando o cliente quer um projeto com neutros, é importante saber usá-los. O branco pode ter subtom vermelho/rosa, azul, amarelo ou verde/cinza. Uma consultora de cor pode ajudar o cliente a escolher o branco perfeito também. 

 Que análise faz à forma como os portuguese lidam com a cor?

Penso que existem muitos mitos que estão enraizados nas mentes portuguesas, como por exemplo que os tetos brancos fazem com que as divisões pareçam mais altas, ou que pintar com alguma cor fora do branco pode fazer com que os espaços pareçam mais pequenos, por isso, a grande maioria não arrisca e não sai do branco. 

Aos poucos, os portugueses estão no caminho para arriscar e a pensar mais fora da caixa. Já começo a ter os meus primeiros clientes portugueses e isso traduz muito bem a mudança que está a acontecer.

 Que conselhos daria a quem gostava de introduzir mais cor em casa mas não tem coragem de arriscar?

O meu primeiro conselho é deitar os preconceitos e mitos pela janela fora e tentar perceber com que cores se relaciona. Que cores da infância o conectam com a sua essência? Quais não? A memória afetiva é vital para perder o medo de usar cores.

Se tem alguma peça de arte ou pintura que adora, pode tirar daí inspiração e começar com algumas cores dessa peça.

Se a pessoa não se sente confiante para introduzir muita cor nas paredes todas, pode começar por uma metade ( é um ótimo background para um sofá neutro que muitas vezes se perde no espaço).

As casas de banho sociais ou pequenas também são ótimos espaços para arriscar. O teto também pode ser nosso aliado para dar personalidade a um espaço. As paredes podem ficar neutras e arriscar na cor do teto. 

O color blocking também é uma ótima maneira de introduzir algum cor e ajudar a sectorizar espaços com diferentes funções. Pode ser utilizado numa parede em casa onde esteja a secretária (home office), ou numa por detrás da cabeceira da cama e qualquer cantinho pode ganhar vida só pelo facto de introduzir alguma cor. 

As portas também podem ser pintadas (é possível pintar só um lado), dependendo do efeito que se quer atingir. Alguns detalhes arquitetónicos também podem ser destacados com uma cor diferente.

É importante saber que sempre que ocorre uma mudança o nosso corpo e a nossa mente reage fortemente no início e depois estabiliza. Por exemplo, quando pintei a minha sala de jantar terracota durante a pandemia, nos primeiros três dias o meu coração bateu muito forte (o vermelho acelera as pulsações), e até duvidei da cor durante 5 minutos, mas alguns dias depois estabilizou e todos em casa adorámos o efeito. O terracota é uma cor que encoraja a sociabilidade e vem da família dos laranjas, que induzem a fome.

O importante na hora de escolher as cores é ter uma paleta que seja um todo para criar flow e harmonia entre os espaços, mais do que escolher cores para cada divisão em separado.

©Ed Robinson

O que nos diz a cor que a Pantone elegeu como a do ano 2023 – o Viva Magenta?

 Viva Magenta é um vermelho suave que é ousado sem ser agressivo.  Corresponde às tendências maximalistas do ano e inspira emoção, otimismo e valentia. Promove a experimentação e a auto-expressão.  É uma tonalidade que pode ser usada para adicionar um toque de cor ou para fazer uma declaração ousada numa sala. 

Quando utilizamos qualquer cor tendência ou cor do ano, o meu conselho é criar uma paleta de cor com essa cor e não usar só essa cor para não ficar “fora de moda” rapidamente. Pensemos na dupla Ultimate Grey e Illuminating Yellow (cores do ano Pantone 2021) e a quantidade de projetos que apareceram semanas depois do lançamento destas cores. Esses interiores rapidamente ficaram desatualizados e conseguimos perceber em que ano foram feitos. Ao incorporar a cor do ano às nossas paletas, não as usando sozinhas, podemos conseguir interiores mais intemporais.

 Que serviços é que a unbox color presta aos seus clientes?

A Unbox Color trabalha em 4 areas:

Color Consultation, Color Design, Color Education e Color Shop.

Color Consultation, para projetos residenciais e comerciais, além de trabalhar em parceria com arquitectos e interior designers na escolha de cores para projetos específicos.

Como Color Designer trabalho em parceria com diversas marcas, na curadoria de cor para diferentes coleções. Agora em específico estou a trabalhar na primeira paleta de cores para uma marca de tintas portuguesa que esperamos lançar em breve.

Como Color Educator organizo workshops de cor para Interiores (A Cor Fora da Caixa), para profissionais e outras pessoas que tenham interesse, e atualmente estou a desenhar outros workshops em português e Inglês como o Color Immersion Days, Color & Coffee mornings (em parceria com uma estilista que faz coloração pessoal) e também vou começar a ter convidados para palestras com temas à volta da cor (estou sempre aberta a colaborações).

O Color Shop no Principe Real foi um espaço concebido para que qualquer pessoa possa ter um encontro com a cor, mexer nas amostras ou simplesmente espreitar um livro de cor. Os profissionais podem trazer os seus clientes e estudar cores e materiais para os seus projetos. Por enquanto só está aberto por marcação e tenho preços especiais para profissionais.

Realiza workshops de cor para profissionais e retiros criativos em Portugal dirigidos também a não profissionais. Este último terá uma edição para breve. O que nos pode contar sobre estes retiros?

 O Color Story Retreat nasceu de uma visão comum com a Elizabeth Olwen (surface e pattern designer) e da forma como nos relacionamos com a cor. É um retiro imersivo criativo para explorar e aprofundar a relação de cada pessoa com as cores. 

Vemos rapidamente as regras de teoria e psicologia de cor, para depois rompê-las e brincar com a cor e as suas diversas combinações.

Na edição de 2022 tivemos 17 participantes de 7 países com backgrounds totalmente diferentes. O feedback que tivemos é que muita gente perdeu o medo a usar cor, algumas reconciliaram-se com certas cores que não gostavam e portanto tinham dificuldade em usar, e outros simplesmente evidenciaram a experiência de estar num espaço com pessoas inspiradoras e sem ecrãs,  que culminou numa visão renovada e numa maior liberdade para usar cor.

A nossa próxima edição será em Setembro deste ano, perto de Lisboa, e as inscrições já estão abertas.

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